A formação de leitores representa um dos grandes desafios da educação
brasileira. De acordo com pesquisa de 2016 do Instituto Pró-Livro, cerca de 44% da população do país não é considerada leitora –
ou seja, não leu ao menos um livro, ainda que em partes, nos três meses
anteriores ao levantamento. Além disso, a média de leitura por habitante ainda
é baixa: são cerca de 5 livros por ano.
Reverter esse cenário e formar leitores certamente não é tarefa fácil,
mas o professor tem um papel muito importante no processo de mudança.
Especialmente na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental,
momento em que o hábito de leitura está sendo desenvolvido.
A pesquisa do Instituto Pró-Livro evidencia a força docente nessa fase:
no Brasil, 18% das crianças de 5 a 10 anos apontam como fator principal para
escolha de um livro a indicação do professor, atrás apenas da capa da obra,
citada por 27% dos entrevistados.
Como o professor influencia a escolha de títulos, saber fazer boas
indicações é fundamental para formar futuros leitores literários.
Mas não só: é preciso estudar a obra, fazer leituras compartilhadas, explorar
sua complexidade, propor discussões e dar voz aos alunos, para que eles sejam
ativos nesse processo, conhecido como mediação de leitura.
Mas como fazer uma boa mediação? A revista Educação conversou
com Patrícia Diaz, diretora da comunidade educativa Cedac e formadora de
professores, sobre aspectos que podem ajudar o docente a desenvolver seu papel
de mediador. Confira:
O que caracteriza uma boa mediação?
A mediação começa quando o mediador escolhe a obra e se prepara para
ler. Nesse momento, os cuidados para a escolha do livro são essenciais e o seu
estudo para o maior conhecimento possível de todas as suas facetas, também.
Assim, no momento da mediação, o mediador poderá atuar com propriedade sobre a
obra e conectar-se ao público.
O ideal é que se leia “com” o outro e não “para” o outro, ou seja, a boa
mediação é a que encanta e envolve o público como participante ativo daquela
leitura, sem que haja uma imposição da forma ou da interpretação da leitura
pelo mediador. A mediação também não acaba quando acaba a leitura do livro, ela
vai além. Uma boa mediação envolve uma boa conversa sobre o livro lido, que vá
para além do óbvio, do “literal” do texto, que estimule os participantes a
falarem o que sentiram, o que pensaram, que chame a atenção para pontos fortes
do livro, que visite novamente algumas páginas, releia trechos etc.
A partir de qual idade pode ser iniciada a mediação de leitura na
escola?
Desde bebês. Existe uma ideia de que os bebês não entendem ou que vão
estragar os livros, mas essas são questões que precisam ser trabalhadas na
formação dos educadores para que consigam enxergar a potência das crianças
desde pequeninas, já que nessa fase elas estão tendo o maior pico de
crescimento cognitivo e têm muita curiosidade e interesse de descobrir o mundo,
investigá-lo e apropriar-se de tudo.
Como escolher os livros a serem trabalhados com as crianças? Quais
critérios devem ser observados?
É muito importante considerar todo o projeto do “objeto” livro: seu
projeto gráfico, o texto em si, as ilustrações, as relações entre texto e
imagem. Também é essencial pensar quais os efeitos e sensações pode causar no
leitor.
Além disso, pensar qual é o conceito de criança que possivelmente o
autor do livro tem. Isso porque existem livros infantis que refletem a falta de
crédito do autor para a inteligência das crianças, abordando as questões de
maneira muito simplificada e artificial, pois não crê que as crianças são
capazes de interagir com uma literatura mais completa e complexa. É também
importante saber um pouco do autor e da editora, pois suas linhas de atuação e
histórico revelam muito sobre os cuidados que foram tomados no processo de
produção do livro.
O professor deve dar orientações aos pais?
É dever da escola explicar aos pais o seu projeto pedagógico e, em se
tratando de leitura, explicar como a escola concebe a formação de leitores, que
princípios têm, como realiza esse trabalho. Nesse sentido, cabe à escola buscar
as melhores formas para dialogar com os pais, compreendendo e respeitando suas
culturas e práticas, mas buscando estabelecer parceria para que escola e
família reforcem atitudes positivas perante a prática leitora.
Não se deve esperar que a família desenvolva a formação leitora das
crianças, já que essa é uma função da escola. Mas, pode haver um movimento da
equipe escolar de envolver os pais em situações de conversas e práticas para
que compreendam e também possam se encantar pela leitura junto com seus filhos
e acompanhar, em casa, esse processo, cada família com suas possibilidades.
Isso vai desde simplesmente perguntar ao filho: “O que você tem lido com sua
professora e colegas em sala?” até retirar livros da biblioteca da escola e/ou
pública para lerem juntos em casa e comentar sobre as leituras feitas.
Como o professor pode se tornar um mediador melhor? Como buscar formação
nessa área?
O ideal é que no seu próprio espaço de trabalho haja espaços garantidos
para que se estude, se reflita e se aperfeiçoe o trabalho de formação leitora
dos alunos. Mas, também é importante complementar essa prática de trabalho
coletivo na escola com especializações, cursos e oficinas sobre mediação de
leitura. Há muitas referências teóricas excelentes nessa área, que podem ser
buscadas para estudos.
É importante, porém, que os professores, com a parceria dos
coordenadores pedagógicos e diretores das escolas, tenham espaços de
formação interna garantidos. Nesses espaços, podem trazer registros de sua
prática com os alunos para serem discutidos e aprofundados, podem ler textos
teóricos para estudar e relacionar com as questões que vivem na prática, podem
analisar livros de literatura para explorar suas possibilidades de mediação,
planejar juntos roteiros para realizar as leituras para os alunos etc.
Fonte: REVISTA EDUCAÇÃO -
http://www.revistaeducacao.com.br/como-fazer-uma-boa-mediacao-e-formar-novos-leitores/